Romance: Tentação da Serpente


Um olhar feminino sobre o Antigo Testamento.
Uma história de mulheres, para mulheres, de que os homens também gostam.

"Tentação da Serpente" é uma reedição de "O Romance da Bíblia", publicado em 2010.

28 outubro 2013

Violência doméstica mata cada vez mais

Em seis meses, o número de mulheres mortas por violência doméstica já ultrapassou mais de metade dos números de 2012.
Mariana Cabral

Perguntar a Maria Macedo, diretora técnica da Associação de Mulheres Contra a Violência (AMCV), quantas mulheres morreram este ano em Portugal vítimas de violência doméstica implica receber uma resposta emocionada: "Uma mulher morta que seja é sempre um número altíssimo".

Em 2012, as mortes contabilizadas são, por isso, "demasiadas": 37, segundo os dados da GNR e da PSP, que também registaram 26.084 queixas de violência doméstica.

Este ano, os números continuam a preocupar. Até junho, já se registaram pelo menos 20 assassínios e 21 tentativas de homicídio relacionados com violência doméstica, de acordo com informações recolhidas pela União de Mulheres Alternativa e Resposta (UMAR) e fornecidas ao Expresso.

Números que podem ser ainda mais graves do que parecem, uma vez que Maria Macedo revela que as autoridades não contabilizam as mortes das vítimas que não falecem no dia e local da agressão, assim como as mortes de pessoas relacionadas com a vítima de violência. "Conheço um caso, no ano passado, de uma amiga de uma mulher agredida que foi assassinada quando foi a casa do casal buscar alguns pertences. Esse tipo de mortes não entra na contagem", diz.

Prisão 'não domiciliária'

Maria Macedo explica também o funcionamento de uma medida de coação a agressores que tem sido cada vez mais utilizada: a pulseira eletrónica. Até 30 de junho deste ano, 149 arguidos estavam sujeitos a esta vigilância, mais do que os 116 registados nos 12 meses do ano passado, segundo dados da Direção-Geral da Reinserção e Serviços Prisionais.

"É uma medida de afastamento. Os agressores têm uma pulseira que não podem retirar e as vítimas têm um dispositivo, do tamanho de um telemóvel, que apita quando os agressores estão a menos de 'x' metros delas. A pulseira também avisa o agressor que tem de se afastar e os sinais são enviados para a Cruz Vermelha, que depois articula a situação com as autoridades".

"Há 20 anos olhavam para nós como se fossemos de Marte"

Prestes a completar 20 anos, a AMCV acompanhou, no ano passado, 9.135 pessoas em situações de violência, numa média mensal de 192 utentes, nos seus centros de acolhimento, casas de abrigo e grupos de ajuda. "De 1993 para cá a situação em Portugal já é completamente diferente, é um tema que as pessoas reconhecem", explica Maria Macedo. "Há 20 anos olhavam para nós como se fossemos de Marte, até relativamente à igualdade sexual." 

"As mulheres são muitas vezes reféns e aguentam num sistema de sobrevivência, sem se mexerem muito para evitarem mais agressões. O risco de morte é maior na altura em que elas vão sair ou quando estão separadas, por isso é que elas têm de estar informadas, para saberem qual a melhor forma de saírem em segurança", explica, justificando a nova campanha da AMCV, intitulada "Esquecer a primeira agressão é tão difícil como esquecer o primeiro beijo".

A AMCV pretende que haja uma maior consciencialização sobre a violência doméstica, pelo que, para além da campanha que irá ser divulgada nas televisões, associou-se ao Benfica para realizar uma ação no jogo das "águias" frente ao Gil Vicente, hoje à noite: conseguir que trezentos casais se beijem ao mesmo tempo no Estádio da Luz, num gesto contra a violência sexual.  
"As pessoas já têm outra forma de olhar, mas não deixa de ser difícil perceber as coisas e intervir, até por parte das famílias, uma vez que o agressor cria estratégias de isolamento. Às vezes não sabem o que podem fazer, as pessoas perguntam-nos isso. Ainda há muitos mitos em relação à violência doméstica", conclui Maria Macedo.
Informações úteis

- Site da Associação de Mulheres Contra a Violência: http://www.amcv.org.pt
- Site da União de Mulheres Alternativa e Resposta: http://www.umarfeminismos.org
- Site da Associação Portuguesa de Apoio à Vítima: http://apav.pt
- Informações da PSP sobre violência doméstica: http://www.psp.pt/Pages/programasespeciais/violenciadomestica.aspx
- Se quiser apoiar a AMCV, pode fazer um donativo através de um SMS para 61966 ou ligar para 760 20 70 40 (€0,60+IVA).

Ler mais: http://expresso.sapo.pt/violencia-domestica-mata-cada-vez-mais=f827213#ixzz2j2dyCud7

27 outubro 2013

No Woman, No Drive



"No woman, no drive" ou "Não mulher, não conduzes!”, a versão satírica da famosa canção de Bob Marley, feita pelo artista e activista árabe Hisham Fageeh, a favor das mulheres da Arábia Saudita que desafiaram corajosamente a proibição de conduzir um automóvel. Com ironia, o artista refere-se à interdição até de cantar e ouvir música que o fanatismo religioso impõe à população, sobretudo aos
jovens e às mulheres. Segue a tradução que fiz da fala do cantor e da letra, para os que não são anglófilos, porque vale a pena perceber o que ele canta.


“Olá, o meu nome é Hisham Fageeh. Sou um
artista e activista social. Na verdade não ouço música, mas enquanto estudava
nos Estados Unidos, ouvi esta canção, cantada por um tipo jamaicano que me
chamou a atenção e eu decidi fazer a minha própria versão, com letra relevante
para a minha cultura, mas sem instrumentos musicais. E agora, com a ajuda dos
meus talentosos amigos, vou cantar:

Não Mulher Não Conduzes!

Não mulher não conduzes!

Digo digo
Digo: eu lembro-me quando tu te costumavas sentar
no carro da família, mas no banco de trás
ova-ovários muito a salvo e bem
para poderes fazer muitos e muitos bebés

Bons amigos tivemos, bons amigos perdemos
na auto-estrada

Neste brilhante futuro
não podes esquecer o teu passado
portanto deixa as chaves do carro de lado

Não mulher, não conduzes!
Não mulher, não conduzes!
Ei, irmãzinha, não toques nesse volante
Não mulher, não conduzes!

Lembro-me quando tu te costumavas sentar
no carro da família, mas no banco de trás

Decerto o motorista pode levar-te a toda a parte
porque as rainhas não conduzem
mas tu podes cozinhar o meu jantar
que eu partilharei contigo

Os teus pés são a tua única carruagem,
mas só dentro de casa – e quando eu digo isto
é mesmo com intenção

Tudo vai ficar bem
Não mulher não conduzes!
Ei, irmãzinha, não toques nesse volante
Não mulher não conduzes!

O protesto das mulheres sauditas

Condutores sauditas já não estavam habituados a ver mulheres ao volante
 


Nunca se vai saber ao certo quantas foram, mas foram mais de vinte as mulheres que desafiaram este sábado a autoridade do Ministério do Interior, da monarquia e da elite religiosa ultraconservadora da Arábia Saudita, participando – ao volante – num novo protesto contra a “tradição” que proíbe a população feminina de conduzir.
May Al Sawyan foi uma das mulheres que aderiu à “campanha”, que teve origem numa “sugestão”: uma petição assinada por 17 mil pessoas a favor do direito das mulheres a conduzir. Num vídeo de quatro minutos, colocado na página de YouTube da campanha, pode ver-se Sawyan, de óculos escuros mas sem esconder a cara, a dirigir um automóvel em Riad, acompanhada apenas pela repórter de uma estação televisiva que registou o acontecimento. “Foi uma volta pequena, e correu tudo bem, Só fui até ao supermercado e de volta para casa”, explicou à Associated Press pelo telefone.

O gesto de “rebeldia” poderia ter tido consequências sérias: as autoridades avisaram que as prevaricadoras (e também os seus “cúmplices”) seriam objecto de sanções, mas May Al Sawyan estava disposta a enfrentar o risco. “Sinto-me muito feliz e orgulhosa por ninguém ter reagido contra mim. Percebi olhares de surpresa em alguns dos carros na direcção oposta, mas percebo perfeitamente: ninguém está já habituado a ver uma mulher ao volante”, lembrou.

A “campanha”, assim denominada uma vez que os protestos políticos são ilegais na Arábia Saudita, foi a terceira desde 1995. Nesse ano, a contestação levou à detenção de 50 mulheres, que além de verem os seus passaportes confiscados também perderam os empregos. Em 2011, uma nova manifestação em várias cidades também terminou com detenções: sob pressão da comunidade internacional, o rei Abdullah acabou por perdoar a pena de Shaima Jastaniya, de 34 anos, condenada a dez chicotadas por conduzir em Jidá.

Não há nenhuma lei ou regulamento a determinar que a condução de veículos está vedada à população do género feminino. A proibição resulta de uma fatwa do Grande Mufti, a principal autoridade religiosa, que nos anos 90 decretou que a condução expunha as mulheres à tentação. Dez anos mais tarde, quando se pôs a hipótese de rever esse edital, uma nova “recomendação” do supremo conselho religioso Majlis al-Ifta al-Aala, que alertou para uma “perigosa” relação de causalidade: nas sociedades onde as mulheres foram autorizadas a conduzir, o “declínio moral” e o “caos social” acentuaram-se.
 
Um relatório que foi entregue à Shura, a assembleia legislativa do reino, apontava algumas das consequências devastadoras do levantamento da proibição: o fim da virgindade, o aumento da pornografia, homossexualidade e divórcio.
 
No Twitter, multiplicaram-se as manifestações de apoio à “luta” das mulheres sauditas pelo direito à condução vindas do mundo inteiro. Agregadas pela etiqueta #women2drive, milhares de mensagens ironizavam com a situação – um dos posts mais populares foi publicado pelo músico, actor e activista Hisham Fageeh, que inventou uma nova letra para a melodia do jamaicano Bob Marley, com o título No Woman, No drive –, enquanto outras mostravam fotografias de mulheres ao volante, condenando a “opressão” e a “discriminação” reservada às sauditas.
 


24 outubro 2013

Infância sem protecção


As leis de Macau deixam muitas crianças sem meios de defesa, sobretudo, em casos de negligência e abuso dentro de casa. Patricia Ip, dirigente da Associação de Luta contra os Maus Tratos às Crianças de Macau, integra a Comissão de Direitos das Crianças de Hong Kong e participou em Genebra na última reunião da ONU para avaliar a protecção à infância em Macau. Não esteve presente qualquer organização não-governamental local.
Maria Caetano 
- O Comité dos Direitos da Criança destaca que tanto em Hong Kong como em Macau não há ainda políticas dirigidas às crianças, num nível institucional, com objectivos claros e vias para a monitorização. Como vê esta situação?
Patricia Ip – É muito triste. Isto, porque não é a primeira vez que o Comité das Nações Unidas faz esta referência, já o dizia claramente em comentários feitos em 2005, recomendando uma política infantil e uma comissão da criança ou instituição humanitária que vigie a implementação da Convenção [dos Direitos da Criança]. A resposta dos governos de Hong Kong e Macau continua a ser a de há diferentes departamentos com a tutela das questões infantis e que realizam esse objectivo. Julgo que a ONU não aceita esta resposta. Não apenas em 2005, mas novamente agora o Comité reiterou que precisamos de uma instituição ou mecanismo específico que supervisione a implementação da convenção.
- No caso específico de Hong Kong, qual tem sido a argumentação?
P.I. – A resposta do Governo de Hong Kong é a de que há diferentes departamentos com políticas para as crianças, que comunicam muito bem entre si. Estão todos sob a secretária-chefe da Administração, que zela pelos interesses das crianças. Para nós, quando cada departamento tem a sua política significa que não é uma política transversal. Além disso, há imensas questões com as quais lidar, o que significa que frequentemente as crianças não são a prioridade. Pedir à secretária-chefe que garanta a implementação de cada um dos artigos da convenção é irrealista e não funciona. Na prática, as questões relacionadas com a infância são atiradas de um departamento para outro. Os problemas não são resolvidos. É por isso que precisamos de um uma entidade independente nomeada para supervisionar o processo. Tanto em 2005 como agora o Comité de Direitos das Crianças diz claramente que este mecanismo deve seguir os ‘Princípios de Paris’, sendo independente, representando vários sectores, tendo autoridade e financiamento adequado, bem como capacidade para investigar queixas de violação dos direitos das crianças.
- Em Macau, há uma única instituição não-governamental centrada na protecção dos direitos dos menores. O Governo continua a defender que tem antes uma política de juventude.
P.I. - A Associação de Luta contra os Maus-tratos Infantis é uma organização não governamental especializada na protecção de crianças. O Governo, através do Instituto de Acção Social, também lida com estas questões. Não somos a única agência com essa responsabilidade. Mas, relativamente às justificações apresentadas pelo Governo, este refere sempre que tem uma política de juventude. No entanto, a definição de jovem vai desde os 13 anos até aos 29 anos.  Para as crianças, a definição é até aos 18 anos. Estão falhar até aos 12 anos. Além disso, muitas das questões que se colocam em relação à infância são diferentes daquelas que se colocam relativamente aos jovens. Definitivamente, uma política de juventude não cobre a Convenção dos Direitos da Criança.
- Ao nível da protecção legal das crianças, o que existe em Macau é a lei geral. Mais recentemente, discutiu-se a proposta de lei sobre a violência doméstica foi abandonada a ideia de criminalização pública que incluiria também a violência dentro de casa contra as crianças. Como vê este processo?
P.I. – Neste momento, estamos muito desiludidos. Quando a discussão começou, tínhamos esperança numa revisão legal que permitisse a denúncia de abusos ou negligência contra crianças dependesse do acto e não ficasse dependente dos pais ou tutores das crianças. Apesar de o Governo alegar que tudo o que é feito tem em vista o interesse da criança, não é claramente o caso. É possível ver nos dados entregues pelo Governo de Macau ao comité que há muito poucos casos de negligência e abuso chegam a tribunal. E em muitos deles a queixa é retirada. Isto indica claramente que a lei não está a proteger as crianças.
- O que sucede quando é o próprio encarregado do menor que é o agressor?
P.I. – Quando se trata de uma agressão física grave, pode haver iniciativa. Mas é necessário decidir o que é ‘grave’, havendo apenas um limite geral. Isto significa que só há acusação pública em casos extremamente graves e que há muitas crianças que não estão a ser protegidas pelo sistema. Depois, nos casos de abuso sexual envolvendo menores até 12 anos há também interesse público na acusação sem assentimento do tutor. Mas, para crianças com mais de 12 anos, é necessário o consentimento dos pais ou tutores. Se um deles for o agressor e ameaçar o outro, fazendo com que este não avance com a queixa, o caso é arquivado. Nestas circunstâncias, a criança acaba por ficar com a família e com o agressor, o que é altamente insatisfatório e deixa as crianças sem protecção. É por isso que defendemos que a lei da violência doméstica deve depender do acto cometido e não da vontade das vítimas.
- Qual é a principal razão para o abandono das queixas?
P.I. – Esta é uma das questões principais. No nosso trabalho em Macau, estamos cientes de situações em que as crianças são socorridas no hospital e depois um dos pais tenta levá-la embora. Os médicos não podem fazer nada, é um direito dos pais. Isto é extremamente insatisfatório.
- E, para lidar com estes casos, seria suficiente haver estatuto de crime público para violência doméstica?
P.I. – Obviamente, não é suficiente. É necessária muita sensibilização pública para que os casos sejam reportados. Uma das primeiras recomendações do Comité da ONU, em 2005 e agora, é a de que a denúncia seja considerada obrigatória. O que sucede actualmente em Macau é que os funcionários públicos estão obrigados a reportar o caso, o que já não sucede com professores, assistentes sociais e outro profissionais que possam tomar conhecimento de situações de negligência e abuso de crianças. Por outro lado, sabemos que há muitas crianças que são deixadas entregues a si mesmas em Macau – inquéritos da nossa associação mostram que muitos alunos do ensino primário são deixados sozinhos. Toda a gente aceita este tipo de situação e não a denuncia. É necessária sensibilização profissional e pública sobre o que constitui negligência e abuso infantil para podermos tomar conhecimento destes casos e ajudar estas crianças. Há ainda outra recomendação das Nações Unidas feita em 2005 e reiterada agora, na qual a organização defende a proibição dos castigos corporais em qualquer situação, mesmo dentro de casa. Isso significa que não aceitamos qualquer tipo de violência. Se a lei de Macau diz que a agressão acontece apenas quando há intenção de prejudicar, a maioria dos pais alega que o castigo é para o bem das crianças, para as tornar mais fortes. Talvez seja por isso que a violência física é tão aceite em Macau. Não é uma questão legal apenas. É preciso recuar um pouco e encontrar maneira de a população perceber o que é melhor para a criança, como a criar sem a agredir, quando denunciar. Depois, na gestão dos casos, é necessária muita formação profissional e colaboração.  É importante também perceber como os órgãos judiciários olham para estes casos. Em Hong Kong, os casos envolvendo crianças têm prioridade nos tribunais. Se este sistema não existe, passarão um, dois, três anos e muito mudará. Além disso, até à condenação não se pode forçar o agressor a sair de casa. A criança fica sob o mesmo tecto que o suspeito, sujeita a pressões e novos abusos. Falta ainda também serviços de apoio e reabilitação para estes casos, que infelizmente continuam a não existir.
- Há uma acusação bastante grave que é feita às autoridades de Macau, relativa a situações de tráfico infantil, na qual o comité fala de corrupção e conivência por parte de dirigentes públicos. O comité fez mais menções a estes casos durante as reuniões que presenciou?
P.I. – Do que me recordo, não desenvolveram muito este aspecto nas sessões de audiência. Mas o relatório, nas conclusões, mostra especial preocupação com a falta de dados. Quando os números são muito baixos, isso não significa que não haja casos. A forma de recolher os dados é importante. Julgo que o comité quer informações apenas sobre as crianças que foram resgatadas, mas também o número daquelas que foram raptadas. Os esforços para a recolha destes dados dependem do Governo. Por outro lado, há muita preocupação de que as crianças sujeitas a tráfico estejam simplesmente apenas a ser enviadas para o lado de lá da fronteira.
- Os dados parecem indicar que apesar de ter havido mais de duas dezenas de menores traficadas nos últimos anos, apenas uma foi alvo de medidas de protecção. As restantes foram repatriadas sem que se saiba mais sobre elas.
P.I. – Nestes casos, é preciso saber que tipo de cuidados de saúde e de aconselhamento precisam, diagnosticar se sofrem de trauma psicológico e encontrar forma de as reabilitar. No repatriamento, segundo sei, muitas das crianças passam a fronteira para regressarem pouco depois. Portanto, isto não está a ajudá-las. Temos regiões administrativas especiais, mas ainda somo um país. Podemos agir melhor para resolver estes problemas. A ONU preocupa-se com todas as crianças individualmente.
- Terá de haver uma base que fundamente as alegações de que há corrupção e conivência por parte dos dirigentes de Macau.
P.I.- Não sei como chegaram a esta conclusão nem de que tipo de informação dispõem.
- As reuniões envolveram todos as participantes? Pôde perceber que tipo de discussões estavam a acontecer?
P.I. – O que sucede é que no processo, os governos têm conhecimento dos artigos da convenção e preparam um relatório antes da audiência. Macau enviou o seu relatório no final de 2012. Após a leitura, o comité marcou reunião para Setembro e, cerca de seis meses antes, em Fevereiro, reuniu dados de organizações não-governamentais que puderam enviar os seus representantes e Genebra para um diálogo com os membros do comité.  A partir daí, o órgão prepara uma lista de questões para os governos onde pede informação adicional. É enviada a informação e a sessão é pública, ficando até online. Na nossa sessão, de seis horas, a maior parte das questões teve que ver com o Continente. Houve uma parte dedicada a perguntas aos dirigentes de Hong Kong e Macau. As organizações não-governamentais ficam sentadas no fim da sala e escutam apenas, não podem colocar questões.
- Refere que uma das preocupações é a de que estas vítimas menores estejam a ser repatriadas para voltarem imediatamente a seguir. Devia haver um sistema mais eficaz de identificação de criminosos e vítimas nas fronteiras?
P.I. – Porque se trata de tráfico, é necessária a colaboração entre as duas jurisdições, Continente e Macau. Tudo passa pela prevenção, detecção e reabilitação. O comité da ONU pede que se olhe para as razões que fazem com que as crianças estejam a ser  traficadas. Há que ver como as crianças estão a crescer nos diferentes países, quais os cuidados que recebem, porque são raptadas e traficadas. Há também crianças cuja situação doméstica é tal que as leva a querer atravessar a fronteira, acabando por ser sujeitas a prostituição infantil, por exemplo. É ainda necessário perceber o seu contexto de origem e aquilo para que voltam após repatriadas prevenindo que voltem a ser traficadas. É necessária muita cooperação.
- Ainda assim os menores não deviam conseguir atravessar a fronteira sozinhos. Como é que isto acontece?
P.I. – Não conheço profundamente a situação em Macau. Mas em Hong Kong, por exemplo, há formas de entrar legitimamente na fronteira ou ainda com documentos falsos. Também podem chegar de barco clandestinamente. O controlo de fronteiras é importante, mas há que verificar a autenticidade dos documentos e averiguar circunstâncias suspeitas. Poderá haver muitas formas de entrar num país ou região sem ter de passar nas fronteiras.
- Outra questão que a ONU aborda é o sistema de adopção vigente em Macau, com muitas crianças ao cuidado de instituições e não em ambiente familiar.
P.I. – Olhando para as estatísticas do relatório, vê-se que há muito poucas adopções. Há assim tão poucas crianças disponíveis para adopção? Há crianças normais a serem adoptadas. E crianças portadoras de deficiência? Como é que se está a gerir a situação destas crianças? Sei também que há preocupação em Macau com a condição de adolescentes que pretendem abdicar dos filhos, mas é necessário que tenham 18 anos para que haja adopção. Isto beneficia as crianças? Quanto mais cedo puderem ser adoptadas, melhor. Manter estes bebés em instituições não é desejável de todo. Há por outro lado um sistema de acolhimento familiar, mas para crianças entre os três e os 12 anos, que poderá ser estendido até 18 anos. Mas não para as crianças até três anos. O Comité recomenda aos governos que procurem, sistematicamente, formas de retirar as crianças das instituições, e não o contrário.

(Ponto Final - Outubro 17, 2013)

23 outubro 2013

Arábia Saudita: O Fanático e a Heroína

A Arábia Saudita é o único país do mundo que proíbe as mulheres de conduzir
 
 
 Sheikh Saleh bin Saad al-Lohaidan , um dos religiosos conservadores mais importantes da Arábia Saudita, defendeu que a condução de automóveis pode danificar os ovários das mulheres.

"Se uma mulher conduz um carro sem que seja absolutamente necessário pode sofrer consequências psicológicas negativas, já que existem estudos médicos fisiológicos que demonstram que a condução afecta automaticamente os ovários e pressiona a pélvis para cima", afirmou o xeque saudita. "Por isso achamos que aquelas que conduzem habitualmente têm crianças com problemas clínicos de diferentes níveis", assegurou numa entrevista dada à publicação digital Sabq.org.
 
 Sheikh Saleh bin Saad al-Lohaidan defendeu ainda que as mulheres que desafiam a proibição de conduzir deviam privilegiar "a razão em vez do coração, emoções e paixões". A Arábia Saudita é o único país do mundo que proíbe as mulheres de conduzir. Apesar de não exisitir uma lei específica, apenas os homens têm direito a obter carta de condução. A proibição baseia-se em fatwas (éditos) emitidos por líderes religiosos wahhabitas, corrente rigidamente puritana muito influente junto da monarquia saudita. As mulheres que forem identificadas a conduzir podem ser multadas e detidas. Na Arábia Saudita, as mulheres precisam de uma autorização por escrito do marido, pai, irmão ou mesmo do filho para sair do país, trabalhar ou até submeter-se a operações cirúrgicas.
 
Saleh al Luhaidan é conselheiro jurídico numa associação de psicólogos. Pode aconselhar o Governo e influenciar as políticias conservadoras do regime.

Um grupo de activistas lançou recentemente uma campanha para contestar a proibição de conduzir, pedindo às mulheres sauditas para saírem à rua com os seus próprios carros no próximo dia 26 de Outubro. O site que promove a acção está bloqueado no país desde hoje. A contestação contra a proibição é crescente e muitas mulheres partilham nas redes sociais e no YouTube imagens de si mesmas a conduzir. Manal al-Sharif, 32 anos, consultora de tecnologias de informação, divulgou em 2011 um vídeo em que conduzia e incentivava outras mulheres a aderir ao movimento Women2Drive. Acabou presa. Foi obrigada a pôr por escrito que não voltaria a conduzir e foi libertada dez dias depois de ter sito detida. Em Junho deste ano, Manal al-Sharif foi uma das convidadas das conferências TED. "Houve uma campanha de difamação organizada contra mim. Foi uma punição por me ter atrevido a desafiar as regras da sociedade", contou. "Tornei-me numa vilã no meu país e uma heroína no estrangeiro". Manal al-Sharif, que entretanto se tornou uma activista por esta causa, diz que lhe perguntam muitas vezes quando é que ela acha que as mulheres vão poder conduzir na Arábia Saudita. "Só se as mulheres pararem de perguntar 'quando'?"

A lunatic Saudi Arabian cleric and the women's ovaries

Driving injures women’s ovaries, says Saudi sheikh, as day of civil action planned

 

15 outubro 2013

Tráfico de crianças em Macau é “problema sério”


O turismo sexual envolvendo menores continua a ser um problema sério em Macau, referem conclusões apresentadas ontem, em Genebra, de um relatório de especialistas do Comité dos Direitos da Criança (CDE, sigla em francês).
As conclusões dos peritos indicam um aumento do tráfico e rapto de crianças para exploração sexual e laboral em Macau.

“Parece que este problema está vinculado com os casinos, os quais financiam em grande parte as despesas do Governo. Os casinos atraem este tipo de negócios, aumentando as possibilidades para jovens de serem explorados sexualmente”, disse à Agência Lusa Kirsten Sandberg, presidente do Comité dos Direitos das Crianças, que abordou a situação das crianças em vários países.
De acordo com a mesma fonte, geralmente as crianças vítimas deste tráfico provêem de toda a Ásia, incluindo Macau e continente chinês. A presidente do Comité não exclui a hipótese de as redes de tráfico destas crianças estarem relacionadas com as mesmas redes que levam empregadas domésticas das Filipinas para Macau e Hong Kong.

Por seu lado, Benyam Dawit Mezmur, vice-presidente do CDE, sublinhou a preocupação daquele organismo com a alegada conivência de oficiais do Governo com este tipo de actividades, de acordo com as informações recolhidas junto de organizações não-governamentais.
Segundo a mesma fonte, esta conivência potencia a impunidade dos responsáveis por estes crimes.

“Informações recolhidas indicam que o Governo não leva a sério este problema”, acrescentou.
Neste sentido, o comité recomenda a Macau que procure as causas destas actividades que incluem tráfico de crianças, exploração sexual de menores, prostituição, turismo sexual, venda de crianças para adopção, pornografia infantil e pedofilia.

A gravidade do problema tem de ser avaliada, assim como a identificação de crianças em risco e elaborado um programa de combate a estas actividades, referem os peritos, nas conclusões do relatório.
O CDE é um órgão das Nações Unidas criado com o objectivo de controlar a aplicação pelos países das disposições da Convenção sobre os Direitos da Criança e dos dois protocolos desta convenção relativos ao envolvimento de crianças em conflitos armados e à venda de crianças, prostituição infantil e pornografia infantil.

Ponto Final | Outubro 10, 2013

13 outubro 2013

The Price of Sex (Trailer)


The Price of Sex is a feature-length documentary about young Eastern European women who've been drawn into a netherworld of sex trafficking and abuse. Intimate, harrowing and revealing, it is a story told by the young women who were supposed to be silenced by shame, fear and violence. Photojournalist Mimi Chakarova, who grew up in Bulgaria, takes us on a personal investigative journey, exposing the shadowy world of sex trafficking from Eastern Europe to the Middle East and Western Europe. Filming undercover and gaining extraordinary access, Chakarova illuminates how even though some women escape to tell their stories, sex trafficking thrives. Learn more at www.priceofsex.org .

The Price of Sex


Publicado em 08/05/2012


Behind the Story. Photojournalist Mimi Chakarova tells CIR about her experience filming undercover for "The Price of Sex," a documentary about young Eastern European women who have been drawn into a netherworld of sex trafficking and abuse.

The Price of Sex


Publicado em 01/10/2012


"The Price of Sex" profiles the forgotten Eastern European women who have been drawn into the netherworld of sex trafficking and abuse. It is a story told by young women who were supposed to be silenced by shame, fear and violence.

Photojournalist Mimi Chakarova, who grew up in Bulgaria, takes us on a personal investigative journey, exposing the shadowy world of sex trafficking from the isolated farms of Eastern Europe to the crowded brothels of the Middle East and Western Europe. Filming undercover and gaining extraordinary access, Chakarova gives voice to women who have escaped the illicit sex trade and are brave enough to tell their stories.

In this excerpt, Jenea details how she left her rural village in Moldova to work as a housekeeper abroad, only to wind up as a virtual prisoner in a foreign brothel, forced to work as a prostitute.