Romance: Tentação da Serpente


Um olhar feminino sobre o Antigo Testamento.
Uma história de mulheres, para mulheres, de que os homens também gostam.

"Tentação da Serpente" é uma reedição de "O Romance da Bíblia", publicado em 2010.

16 junho 2014

Há já 186 mulheres com "botão de pânico" contra ex-companheiros

Violência doméstica. Dispositivo de teleassistência está equipado com GPS e permite pedir apoio imediato, 24 horas por dia, mal o agressor se aproxime   Serviço de teleassistência existe há cinco anos e o número de vítimas apoiadas é agora o maior de sempre. Trata-se de um sistema tecnológico de comunicação móvel e de telelocalização que a vítima aciona se o agressor se aproximar, num pequeno aparelho - a que as foi mulheres chamam "botão de pânico", Além de ter sistema de georreferenciação, está ligado a uma central com técnicos especializados todo o dia. O DN foi conhecer como este dispositivo ajudou a mudar a vida de uma mulher que era perseguida pelo ex- companheiro. Há 186 mulheres protegidas com botão de pânico" contra violência  

 Teleassistência. Medida existe há cinco anos e ajuda vítimas a atenuar a ansiedade, a sentirem-se seguras e a refazer ávida. Pequeno aparelho está ligado a central, tem GPS e pode ser acionado 24 horas por dia. Psicólogos encaminham  

 "Não me sinto sozinha e eu vivo sozinha. Antes de ter o botão, quando ia para casa falava sempre ao telemóvel porque se ele aparecesse avisava quem estava do outro lado, agora não sinto essa necessidade. Se ele quiser dar um tiro ou atirar ácido, pode fazê-lo, mas sei que mesmo numa situação dessas tenho uma assistência mais rápida." Assim justifica Cláudia (nome fictício) a segurança que sente desde que é uma das 186 vítimas de violência doméstica protegidas pela teleassistência, "um sistema tecnológico de comunicação móvel e de telelocalização" que ela aciona se o agressor se aproximar.  

 As mulheres chamam-lhe "o botão de pânico" - porque só deve ser pressionado em caso de perigo e a ajuda chegará em minutos, como testemunhou Cláudia nas quatro vezes que usou no dispositivo. É vítima de stalking, assédio e perseguição do ex-companheiro que não aceita o fim da relação. Carregou no botão nas vezes em que ele lhe apareceu à frente - apesar de estar impedido judicialmente de o fazer -, e quando ouviu barulhos estranhos no prédio. Há um mês que o aparelho da teleassistência faz parte dos objetos imprescindíveis que Cláudia põe na mala quando sai de casa. Tem-no desde que procurou ajuda das autoridades para pôr fim a uma relação de três anos, "com acusações, mentiras, chantagem, afastamento dos amigos, violação da correspondência, do telemóvel e do computador", e que tentou "terminar dezenas de vezes".  

 Ele começou por a proibir de falar com os amigos. Apoderava-se do seu telemóvel para apagar as mensagens e dizia-lhe que ninguém se importava com ela. Repetia que ela estava a ficar velha, que não valia nada. Maus tratos psicológicos e que se foram intensificando até minar todo o núcleo de amizades à volta de Cláudia. Até ela se sentir ainda mais vulnerável do que quando a relação começou. Na altura tinha perdido o emprego. "Foi complicado, pensava que arranjava facilmente trabalho porque sempre tinha arranjado, mas não foi assim. E quando nos dizem 'eu sou a única pessoa que te ama', acabamos por acreditar", justifica. Nunca lhe passou pela cabeça que iria fazer parte das estatísticas da violência doméstica. Ela, bonita, tão segura de si e das suas capacidades.  

 Um dia confessou a uma amiga, psicóloga, que ele a perseguia. Contou-lhe o terror em que se tinha transformado a sua vida, presa em casa. Vivia às escuras, persianas corridas e luzes apagadas, para que ele não percebesse que ela estava lá. A amiga aconselhou-a a ligar para a Associação de Mulheres contra a Violência. "Telefonei, chorei desalmadamente. Contei o que se passava, disseram-se que eu era uma vítima, quando nunca me vi como tal. Agora sei que sou uma vítima", conta Cláudia, 38 anos. Aconselharam-na a apresentar queixa no Departamento de Investigação e Ação Penal (DIAP). Esperou dois dias até dar o passo. Só tem elogios a fazer do atendimento que lhe tem sido prestado nos organismos públicos. "Fui acolhida no DIAP por uma funcionária judicial, uma pessoa extraordinária. Na primeira hora eu não conseguia articular uma palavra, só dizia 'ajudem-me!, e ela respondia 'aqui está em segurança'."  

 Fernanda Alves, a procuradora do DIAP, 7ª secção, é a responsável pela aplicação da medida de teleassistência em Lisboa, onde o sistema tem sido mais usado, 34 em 2013, 29% do total do País nesse ano (117). Atualmente são 186 as mulheres protegidas. "Representa uma segurança para a vítima que está mais fragilizada, sabe que há sempre alguém que está do outro lado, é uma resposta para situações de emergência", explica Fernanda Alves. Tem também um papel psicológico, "atenua níveis de ansiedade, aumentando e reforçando o sentimento de proteção e de segurança das vítimas", "minimiza a situação de vulnerabilidade em que se encontram", completa a procuradora do Ministério Público.  

 Cláudia arranjou emprego, está a recuperar o contacto com a família e com os amigos, quer passar a mensagem a outras mulheres. Faz questão de que o ex-companheiro seja punido judicialmente. "As pessoas podem pensar que não vale a pena apresentar queixa, que a Justiça não funciona. Mas isto funciona mesmo."  

 COMO FUNCIONA  

 Serviço gratuito e permanente   O Serviço de Teleassistência a Vítimas de Violência Doméstica existe desde 2009 (Lei n° 111/2009 de 16de setembro) e tem vindo a multiplicar o número de vítimas protegidas. Em 2011 estavam ativas 13 medidas, e em 2012, 47. Hoje são quase quatro vezes mais. O serviço é gratuito e garante comunicação 24 horas por dia através de equipamentos de comunicação da rede voz móvel. Está ligado ao Centro de Atendimento Telefónico da Cruz Vermelha, que integra técnicos, na maioria psicólogos. São eles que fazem a ligação às autoridades policiais para prestarem auxílio e a localização é feita por GPS. São informados pela vítima sempre que esta se desloca para fora das zonas habituais, estabelecem o contacto, ouvem.  

Céu Neves
Publicado no Diário de Notícias a 11 de Junho de 2014

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